Pousada Sossego do Cacto
Senhor Onofre te espera para o seu primeiro dia como recepcionista em uma pousada macabra.
Pousada Sossego do Cato
Senhor Onofre te espera para o seu primeiro dia como recepcionista em uma pousada macabra.

Capítulo 1: A Vaga Maldita
Gabriel não podia mais escolher. Contas acumuladas, aluguel atrasado, mãe doente. Quando viu o anúncio oferecendo R$ 500 por noite para recepcionista noturno, clicou sem pensar.
A pousada ficava fora do mapa, numa estrada de chão onde o sinal de celular sumia e os arbustos pareciam vigiar. Quando chegou, a construção velha e torta o recebeu com uma sombra que parecia se mover por vontade própria.
Na recepção, um homem magro o esperava. Rosto cinzento, olhos fundos como poço.
— É simples. Só seguir as regras. — entregou uma folha plastificada.
As Regras:
Seu Onofre, o vigia, faz rondas noturnas. Não fale com ele. Não o encare. Um leve aceno de cabeça basta. Ignore sons estranhos que ele emitir.
A partir da meia-noite, todos os quartos ímpares devem estar vazios e trancados. Se um estiver entreaberto ou barulhento, apenas feche e tranque. Jamais entre.
Se o telefone tocar entre 3h e 3h33, não atenda. Deixe tocar até parar.
A luz do pátio interno deve permanecer acesa. Se ela apagar, trave a porta da recepção e não saia.
Ao fim do turno, saia em silêncio. Seu Onofre estará na varanda. Não fale com ele. Não o olhe. Se ele sorrir... a vaga estará aberta novamente.
— Ainda quer o dinheiro? — o homem perguntou.
Gabriel engoliu em seco e assentiu.
O relógio marcava 21h59.
Capítulo 2: O Vigia Silencioso
Às 22h06, passos. Pesados. Arrastados.
Seu Onofre surgia pela lateral, andando com a lanterna pendurada e um andar morto. Os olhos dele... eram cinzas. Sem expressão.
Gabriel o viu pela porta de vidro da recepção. Segurou o ar. Lembrou da Regra 1.
“Não fale. Não encare. Só acene.”
Ele acenou com a cabeça.
O vigia andou em silêncio até parar, virando a cabeça para Gabriel com lentidão grotesca. Dos lábios, saiu um murmúrio baixo, quase choroso.
— A carne se mexe mesmo morta...
Gabriel quase respondeu, mas travou.
“Ignore os sons.”
Seu Onofre seguiu andando. Mas o cheiro que ficou... era de carne podre.
Capítulo 3: Portas que Não Devem Abrir
Às 00h15, Gabriel saiu com o molho de chaves para conferir os quartos. A madeira do piso gemia como se doesse.
Quartos pares: 2, 4, 6... Todos fechados.
Mas ao chegar no quarto 5, a porta estava entreaberta. Um som baixíssimo escapava dali.
Risos. Sussurros. Vozes de crianças... ou algo fingindo ser criança.
Ele congelou. Lembrou da Regra 2.
“Feche e tranque. Não entre, aconteça o que acontecer.”
Empurrou a porta devagar, viu sombras deslizando sobre as paredes. Uma mão pequena apareceu no batente.
Ele bateu a porta e girou a chave.
De dentro, um grito:
— EU AINDA ESTOU AQUI DENTRO! NÃO É JUSTO!
As outras portas ímpares começaram a vibrar levemente. Gabriel saiu correndo.
Capítulo 4: Toque do Inferno
Às 3h01, o telefone da recepção tocou. Um som seco e metálico, diferente de qualquer toque real.
O visor brilhava em vermelho, mesmo sem estar ligado à energia.
Toque... toque... toque.
Regra 3: “Não atenda o telefone entre 3h e 3h33.”
Gabriel se ajoelhou atrás do balcão, cobrindo os ouvidos. Mas o som continuava dentro dele.
— Gabriel... — sussurrou o telefone.
— Me deixa em paz... — ele murmurou, apertando os olhos.
Às 3h33 em ponto, o telefone se calou.
Quando ele olhou de novo, o fio estava desconectado. Não havia energia.
Capítulo 5: A Escuridão Gosta de Você
Às 4h08, a luz do pátio interno piscou. Depois, apagou.
Gabriel sentiu a temperatura cair bruscamente. Um cheiro de lama e pelos molhados invadiu a recepção.
Ele se lembrou da Regra 4:
“Se a luz do pátio apagar, tranque a porta e não saia.”
Correu e girou a chave duas vezes.
Lá fora, passos. Pesados. Lentíssimos.
A sombra passou diante da janela. Alta. Muito alta. Ela parou e tocou o vidro.
Cinco dedos. Mas no reflexo, havia sete.
A luz acendeu sozinha.
Nada estava mais lá. Apenas a marca da mão — como carvão queimado.
Capítulo 6: O Sorriso Proibido
Às 4h58, Gabriel estava com tudo pronto. Mochila nas costas, chave na mão.
Ele respirava rápido, o corpo gelado. Lembrou da última e mais importante regra.
Regra 5: Ao final do turno, não fale, não olhe para Seu Onofre. Se ele sorrir, corra.
Abriu a porta da recepção. O ar estava parado.
Seu Onofre estava lá. Parado.
Gabriel andou sem olhar. Três passos. Quatro. Quinto...
Algo o chamou. Um sentimento impossível de ignorar. Ele virou o rosto.
Seu Onofre sorria. A boca rasgada, os dentes finos, em múltiplas fileiras.
— Vejo você de novo... — disse ele, com voz de coisa enterrada.
Gabriel correu até o carro, e só acelerou quando os postes começaram a apagar atrás dele.
Capítulo 7: Dinheiro Sujo
Às 8h da manhã, o celular de Gabriel vibrava.
Pix recebido: R$ 500.
Descrição: “pelo silêncio.”
Mas onde quer que ele fosse, a pousada surgia. No GPS. Nos outdoors. Em mensagens de desconhecidos.
Uma madrugada, acordou de novo atrás do balcão.
O relógio marcava 21h59.
Ele gritou. Ninguém ouviu. Só o som de passos arrastados no corredor.
Seu Onofre esperava. Com o mesmo sorriso.
Capítulo 8: A Vaga Está Aberta
Em um grupo de empregos no WhatsApp, um novo anúncio circulava:
“POUSADA INTERIOR – VAGA NOTURNA (22h-5h). R$ 500 a diária. Início imediato. Regras simples.”
Letícia aceitou. Era nova na cidade. Não tinha medo.
Chegou às 21h52.
Um recepcionista magro entregou a ela uma folha plastificada. Gabriel? Não parecia ele... mas os olhos estavam mortos.
— Boa sorte — disse. E desapareceu pela porta lateral.
Letícia sorriu, achando tudo bizarro.
A folha tremia em suas mãos. No verso, uma frase escrita à mão:
“SE ELE SORRIR, NÃO CORRA. JÁ É TARDE.”
O relógio marcava 21h59.
A pousada inspirava fundo.
Ela tinha fome de novo.
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