Hospital em Serra Sombria
Fenômenos inexplicáveis acontecem dentro das instalações hospitalares.
Lilo
4/3/20255 min read
Hospital em Serra Sombria
Fenômenos inexplicáveis acontecem dentro das instalações hospitalares.

Capítulo 1: A Proposta
O e-mail chegou numa manhã nublada, no exato instante em que o doutor Rafael Farias assinava seu último relatório de estágio no hospital universitário. O título da mensagem era simples, quase banal: "Oportunidade de Residência – Urgente".
Abriu com desconfiança, mas a curiosidade logo venceu o cansaço. O conteúdo parecia surreal: o Hospital Municipal de Serra Sombria, no interior da Bahia, oferecia uma vaga de residência médica com salário de R$ 25.000 mensais, alojamento gratuito e carga horária reduzida.
A proposta veio acompanhada de elogios à sua ficha acadêmica e um convite para embarcar em algo “diferente, porém promissor”. Havia um anexo com um contrato informal e uma mensagem enigmática: “Se aceitar, esteja lá até o próximo domingo. E memorize as regras.”
Quatro regras, destacadas em negrito, dominavam o final da carta digital. Rafael leu, releu, e riu — era algum tipo de trote? Mas o contato era legítimo, confirmado pelo CRM, e o nome do diretor do hospital, Dr. Paulo Meireles, constava em registros oficiais.
No sábado, Rafael fez as malas.
Capítulo 2: A Chegada
Serra Sombria não constava no GPS. Rafael precisou seguir placas antigas por estradas de terra, ladeadas por mata fechada. O clima parecia permanentemente encoberto, mesmo ao meio-dia. Ao chegar, notou que a cidade — se é que se podia chamar assim — era formada por não mais que vinte casas, uma igrejinha e o hospital.
O prédio do hospital era antigo, colonial, com fachada amarelada e janelas de madeira escura. Um letreiro de ferro enferrujado balançava com o vento: “Hospital Municipal de Serra Sombria – Fundado em 1891”.
Foi recebido por uma enfermeira calada, de cabelos presos num coque firme. “Bem-vindo, doutor. Seu quarto é o 203. Começa hoje à noite. Memorize as regras.” Ela entregou um papel com as quatro instruções já lidas. Desta vez, estavam digitadas numa máquina de escrever, com letras trêmulas.
No refeitório, conheceu o enfermeiro Josué. “Você é o novo, né? Espero que goste de silêncio. E siga as regras. Especialmente a quarta.”
Capítulo 3: Portões Fechados
O primeiro plantão noturno parecia calmo demais. Rafael tentava relaxar, folheando um velho exemplar de neurologia, quando o relógio marcou 2h58.
Josué surgiu, trancando o portão com uma chave grande de bronze.
“É sério isso?”, perguntou Rafael.
“O portão só abre às 4h. E se alguém aparecer, você já sabe: ‘O Dr. Antunes está a caminho’.”
Às 3h17, alguém bateu.
Rafael se levantou, sem pensar. Do lado de fora, um homem sangrava no ombro, apoiado por uma mulher em pânico. “Por favor, doutor, é uma emergência!”
Rafael olhou para Josué, que mantinha o olhar firme. “Diz pra ele que o Dr. Antunes tá vindo.”
Engolindo seco, Rafael repetiu a frase.
A mulher gritou, implorou, chorou. O homem bateu com a testa no vidro. Mas, lentamente, ambos recuaram até desaparecerem na neblina.
Rafael não dormiu naquela noite.
Capítulo 4: O Sanfoneiro
Na terceira noite de plantão, por volta das 22h, o som de uma sanfona ecoou pelos corredores. Era triste, arrastado, antigo.
Da recepção, Rafael viu um velho curvado carregando algo nos braços. Ao se aproximar, percebeu: era um corpo, coberto por um manto branco. O velho usava chapéu de couro e vestia trajes típicos, mas havia algo antinatural em seus olhos — opacos, como vidro fosco.
Sem dizer uma palavra, ele apontou para o leste do hospital.
Rafael hesitou. O velho não falava, não respirava. Apenas fitava.
Com mãos trêmulas, Rafael abriu a porta da ala leste. O sanfoneiro entrou, desaparecendo corredor adentro, ainda com o corpo nos braços.
Quando Rafael virou para trás, ele já não estava mais lá.
Capítulo 5: A Idosa
Foi durante uma queda de energia.
Tudo se apagou às 2h44 da manhã. Rafael, já acostumado ao breu da ala antiga, buscou uma lanterna. Quando apontou o facho para o final do corredor, viu.
Uma idosa. Magra, pálida, parada como uma estátua, olhando fixamente para ele.
Seu vestido era antigo, rendado, coberto de manchas amareladas. O rosto, enrugado demais. Os olhos — vazios, famintos.
Rafael congelou. O papel das regras dizia: “Fingir que não viu. Ir para a sala de descanso. Esperar 10 minutos.”
Virou-se com dificuldade. A sensação de ser seguido era sufocante. Trancou-se na sala de descanso e esperou em silêncio absoluto, sem ousar piscar.
Dez minutos depois, murmurou: “Você está aí?”
Nada. O corredor, quando voltou, estava vazio.
Capítulo 6: O Eco do Subsolo
Na noite seguinte, Rafael jantava sozinho quando ouviu. Fraco, como se viesse de muito longe: choro.
Lento, agudo, persistente. A origem parecia ser o chão — mais precisamente, o antigo necrotério.
Ele desceu um degrau, só um.
Mas então lembrou. “Não desça nunca.”
Correu de volta, ligou a televisão da sala dos médicos no volume máximo. O choro aumentava, como se suplicasse por socorro. Por instantes, pareceu ouvir seu nome sendo chamado.
A voz era de uma criança.
Cobriu os ouvidos e se encolheu na poltrona.
O som cessou às 4h13.
Capítulo 7: O Dossiê
No oitavo dia, Rafael explorou os arquivos. Em uma sala trancada, encontrou uma caixa etiquetada como “casos inclassificáveis”.
Havia fotos antigas, algumas em preto e branco. Em todas, figuras com mantos brancos, sanfoneiros imóveis, pacientes sem rosto. Um recorte de jornal datado de 1963 dizia: “Hospital de Serra Sombria mantém práticas tradicionais contra ‘visitantes da neblina’.”
Num envelope separado, uma única foto: a idosa do corredor. Ao fundo, Rafael. A data? Dois dias antes de sua chegada.
Capítulo 8: O Dr. Antunes
Rafael confrontou Josué.
“Quem é o Dr. Antunes?”
Josué se calou. Depois de um longo suspiro, respondeu: “Era o residente antes de você. Não seguiu as regras. Quando o portão fechou, ele atendeu alguém... A mulher com o manto.”
“E depois?”
“Depois? Agora é ele quem responde quando alguém aparece de madrugada.”
Naquela noite, às 3h02, bateram no portão de novo.
Rafael respirou fundo.
“O Dr. Antunes já está a caminho.”
Capítulo 9: O Último Manto
Dias depois, o sanfoneiro retornou. Carregava outro corpo.
Desta vez, Rafael viu algo se mover sob o tecido. Quase recuou, mas manteve a compostura.
Enquanto o velho entrava na ala leste, Rafael ouviu um murmúrio vindo debaixo do manto:
“Me ajuda...”
Ficou paralisado. Pensou em correr, levantar o tecido, fazer algo. Mas a lembrança da regra soou como um trovão em sua mente.
“Nunca retire o manto.”
Ele virou as costas.
O som da sanfona preencheu os corredores até o amanhecer.
Capítulo 10: Serra Sombria Espera por Você
Rafael nunca pediu demissão.
Não porque não quisesse. Mas porque o hospital jamais permitiu. O contrato não tinha cláusula de saída. O ônibus de volta nunca vinha. E toda carta enviada era devolvida com a mensagem: “Destinatário inexistente.”
Ele ainda cumpre seus plantões. Segue as regras. E às vezes, olha pela janela da sala dos médicos e vê novos residentes chegando com malas nas mãos.
Alguns perguntam: “Isso tudo é verdade?”
Rafael apenas sorri.
“R$ 25.000 por mês. Serra Sombria espera por você.”
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